quarta-feira, junho 28, 2006

SOBRE O FRACASSO

Mais um dia, mais um fôlego a ser tomado, mais uma ânsia pelas coisas e a sensação de perda, de se estar perdida permanece. O que é doce , no entanto, é essa sensação de pausa, de sonolência de tudo, um suspense, estar suspensa, gravidade zero, um contemplar, uma paz. Acho que tanta urgência paralisa, pois tudo parece depender somente de mim e isso demanda que eu pare de arfar, retome o fôlego e estabilize minha respiração. Já que não posso esperar mais nenhuma resposta externa, mesmo tendo semeado alguma coisa na terra que tive nas mãos, é o que me resta agora. Quero tanto, mas ao mesmo tempo não vejo saída agora pros quereres todos que aceito o momento. Não aceito o fracasso (pra mim essa palavra tem um significado particular, que no fim eu explico), mas também me recuso a desenfreadamente buscar a notoriedade, o sucesso e o reconhecimento por desespero e a qualquer custo, me perdendo de mim mesma, me perdendo num emaranhado de equívocos.
O sucesso é consequência também, mas não é o motor para um artista de alma. Um artista mesmo, nato, sabe dos altos e baixos, sabe a que está sujeito e no entanto permanece se sujeitando, pois não há outro jeito. Sua essência é de prosseguir se expressando, criando, mesmo que atinja alguns aqui e outros ali um dia e no outro muitos aqui e muitos ali. Faço música porque preciso ouvir fora de mim a melodia que me persegue, preciso escrever porque preciso organizar o turbilhão de sensações, muitas vezes inexpressáveis que tenho, preciso pintar porque quero exprimir as cores e formas que sei que o mundo pode ter quando nos é dada a oportunidade de recriá-lo, preciso cantar porque é a forma mais imediata e libertadora de dizer e ser compreendida, preciso atuar porque é quando posso demonstrar a minha síntese de toda a humanidade naquela pessoa que me transformei ali. Preciso e respeito essa necessidade, realizando-a. Por fim, o fracasso pra mim é deixar de ser o que se é para ser alguém que vai se distanciando tanto de si , a ponto de aceitar o sucesso de pequenas conquistas, por ter tido medo de sustentar a maior delas: A de nunca se corromper e nunca ter medo de olhar-se no espelho, mesmo que por muitas vezes não se goste do que se vê.

sexta-feira, junho 23, 2006

DEIXAR-SE LEVAR


Me intriga como me parece que a vida dos outros flui com fluência de água, de vento, de elementos naturais, de tudo que existe apenas por respirar. Por vezes me parece que na minha vida, tenho que fabricar vento, fabricar fumaça, fabricar até o próprio ar que, não raro, me falta e me sinto tão cansada. Falo exclusivamente de labuta, do esforço que é alcançar lugar no mundo, pra ocupar mais que apenas o pedaço de chão que nos é designado ao caminharmos. Estou perdida. Não sei nem por onde começar, antes mesmo de ter comecado a tentar algum movimento interno ou externo. Não que eu tenha estado parada, não que as coisas sejam sempre assim, mas sempre se conduzem até tal ponto e terminam, se dissipam simplesmente e me vejo obrigada a recomecar sempre. Não que eu sinta que tudo está perdido, mas sinto pequenas vitórias seguidas de fracassos e nunca há estabilidade, nunca há a lineariedade. Tenho, no entanto plena convicção de minha vocação para imprimir o que percebo no mundo através da via artística, veia artística ou ... vim artista. Ponto. Nada a fazer. O mundo me dificulta consolidar no mundo esse fato, mas é um fato. Que faço, deixo-me levar? Talvez meu pecado seja ser leviana a ponto de acreditar que as coisas se conduzem mais ao sabor da sorte, dos "bons ventos" do que do esforço de um vento fabricado pelos próprios pulmões afim de impulsionar nem que seja um pequenino barco de papel numa banheira. Acredito nisso, no entanto, pelo que observo e não por ser uma verdade minha.
Acho que vou ficar imersa agora e deixar que a água morna conduza meu corpo através de um embalo aleatório, que um ventinho entre pela fresta da porta semi-aberta e fecharei os olhos pra esvaziar o espírito e eliminar a possibilidade de tentar qualquer coisa no mundo. Já aceitei faz tempo quem sou, agora vou tentar aceitar o que tem sido feito de mim. Cansei de tentar, vou me deixar levar. Talvez seja melhor parar de ir e deixar-se levar. Talvez seja a morte necessária em vida para começar a existir. Abandonar as tentativas e deixar-se levar. Abandonar o corpo, deixar-se. Passar a existir depois de anular completamente os sentidos. Sem os sentidos, talvez algo faça sentido.